Marcelo Almeida é meu colega da FGV onde lecionamos nos MBA’s oferecidos por aquela escola. Tive o prazer de convidá-lo para falar para o meu grupo Vistage que reúne empresários, sócios, sucessores e CEO’s de empresas do Rio de Janeiro. Apesar dele ser um expert em diversas áreas relacionadas a gestão de empresas, ele falou para nós sobre aquilo que mais o apaixona atualmente: a má utilização da Tecnologia da Informação como ferramenta de gestão empresarial sobretudo a gestão estratégica.
Por conta do interesse que sua palestra despertou, convidei-o também para uma entrevista no blog “o grilo falante” cujo teor, transcrevo abaixo.
CRM: Marcelo, o título de sua palestra para o grupo Vistage que coordeno foi: “A Defasagem entre a tecnologia empresarial e o dia a dia dos gestores”. Podemos começar pelo o por quê deste título?
Marcelo: Eu meditei por semanas sobre o que seria mais interessante recomendar para um público tão seleto formado por altos gestores de empresas. Recentemente defendi minha tese de doutorado a respeito de um modelo de Gestão Estratégica Integrada que eu desenvolvi. Na revisão bibliográfica e na pesquisa de campo busquei indiretamente entender que características são comuns à empresas consideradas excepcionais para conceber a abrangência do meu modelo. Verifiquei que empresas como Natura, GE Celma, Google, RADIX, entre outras, apresentam uma governança empresarial bem estruturada, processos de negócio bem concebidos e bem assimilados pelos executantes, políticas de gestão de pessoas que alinham a busca de auto realização dos colaboradores com o esforço de atingimento dos objetivos estratégicos e lideranças que aplicam conceitos sustentáveis de negócio e que estimulam a colaboração entre as partes da organização. Mas uma característica a mais ficou muito evidente para mim: empresas excepcionais tendem a dispor de tecnologia da informação aderente às necessidades atuais do negócio e que reflete na sua concepção valores organizacionais vigentes como humanização, qualidade e orientação às necessidades dos clientes. Acredito que, de todos os aspectos importantes que destaquei, o tema Tecnologia da Informação aderente instiga diversas mudanças de paradigma por parte da alta gestão das empresas e isto me levou a discorrer sobre o assunto.
CRM: Marcelo, Como é que você observa o entendimento dos altos gestores sobre a tecnologia da informação atual?
Marcelo: Claudio, devemos reconhecer que o entendimento sobre a relevância da tecnologia da informação para o negócio é quase uma unanimidade. No passado, era mais fácil encontrar gestores que consideravam que “o pessoal dá um jeito” e que “a inteligência está nas pessoas”. Porém, um sinal muito interessante a ser observado é a tolerância que se tem com relação a planilhas eletrônicas. É a forma do “pessoal dar um jeito”. Com a pressão por transparência, governança, eficácia e atendimento a normativas sobre os CEOs, tem-se cada vez mais a percepção de que tecnologia empresarial é muito mais do que planilhas e que a empresa deve estar bem suportada pela TI.
CRM: Então, o problema da falta de entendimento sobre TI está sendo resolvido?
Marcelo: Infelizmente este avanço não foi suficiente para que TI seja observada e usada de forma estratégica. É mais ou menos assim: “Ok, a TI é importante e quero que funcione, sem interrupções, para o que nossa empresa necessita fazer. Quanto custa isto?” Esta postura é defensável e compreensível. Mas este discurso guarda algumas incompreensões. Primeiro, a de que vamos chegar em um ponto em que estaremos bem suportados e pouco haverá de se investir, apenas trabalhar e ajustar. Em organizações, isto não existe. A dinâmica dos mercados e das pressões por excelência sempre imporão novos desafios operacionais, representados por novos processos, que não estarão suportados pela tal “TI estável”. É natural que um organismo vivo evolua e precise que sua estrutura óssea se adapte a esta evolução. Uma empresa é um organismo social vivo e deve estar em constante mutação. E a TI não responde rapidamente a estas mudanças. Daí, a falta de aderência estrutural de TI às necessidades da empresa. Em segundo lugar, a frase implica na falsa ideia de que TI é commodity e que não é fonte de diferenciação. A TI será commodity se você a tratar como tal, buscando soluções bem conceituadas e adaptando-se ao standart dos fornecedores. Não vamos reinventar a roda. Mas com isto, perde-se a oportunidade de ver TI como uma fonte de vantagem competitiva. O que dizer da tecnologia de projeto de aeronaves da EMBRAER, desenvolvida internamente e fonte de capacidade de criação de aviões comerciais excelentes como eles fazem hoje? E os algoritmos de busca do Google? E os sistemas da FEDEX, que gerenciam uma rede única de logística no mundo? Não são produtos de prateleira.
CRM: Você quer dizer então que a TI não está sendo observada pelos gestores como estratégica?
Marcelo: A adoção de metodologias reconhecidas como melhores práticas pela área de TI é um grande avanço. Não partimos mais do zero, temos referências de como se gere e investe em Tecnologia da Informação. COBIT, ITIL, CMM, PMI (boas práticas em Organização, Serviços, Qualidade, Projetos de TI) e muitas outras siglas referentes a boas práticas tem um papel muito importante. Para demonstrar que a gestão de TI é muito mais complexa do que se pensa, não se pode em sã consciência dizer para o Gestor de TI “eu quero isto, te vira!”. O desenvolvimento e a consequente implementação de um sistema de informação de forma atabalhoada por falta de entendimento sobre sua complexidade e risco é uma irresponsabilidade. Saber que empresas ficaram até meses sem faturar porque a implantação de um Sistema Corporativo Integrado (ERP-Enterprise Resource Planning) foi falha ou que a ordem de implantação final (“GO”) foi dada a despeito de recomendações técnicas, apenas para cumprir o prometido com o acionista é preocupante e demonstra que, no fundo, a incompreensão sobre TI ainda está escondida em discursos aparentemente corajosos.
CRM: Isto significa que o CEO não pode confiar em mais ninguém quando se trata de TI? Até mesmo sua gestão interna deve ser vista com desconfiança?
Marcelo: Se você diz que fornecedores, consultores, desenvolvedores, gestores, especialistas em governança de TI, todos devem ser vistos com desconfiança, não chegaria a tanto. Na verdade, acredito que cada um quer fazer o melhor. Mas os interesses do que é o melhor podem ser conflitantes. Fornecedores podem querer implementações padrão sem mistério. Consultores podem querer continuidade dos seus contratos, sempre apontando para algo a ser feito. Desenvolvedores querem terminar o que começaram e podem tender a buscar caminhos curtos que não ficarão evidentes em um primeiro momento. Gestores podem estar direcionados a atingir metas, custe o que custar. Especialistas em Governança de TI podem se perder por entre as normativas e esquecer da necessidade de geração de valor do negócio. O gestor de TI interno pode ter um viés de buscar a estabilidade para a demanda sobre a área e redução de seus problemas. Assim, respondendo à sua pergunta, todos estes stakeholders devem ser vistos com reservas se não estiverem alinhados com a geração de valor do negócio.
CRM: E como é que se faz isto?
Marcelo: Eu dediquei a minha vida profissional e acadêmica a encontrar uma resposta. Minha tese de mestrado foi sobre Planejamento de TI como ação estratégica e na minha tese de doutorado busquei formular um modelo integrado de gestão estratégica que possa ser utilizado por qualquer empresa. Eu conduzi mais de uma dezena de implementações diferenciadas de TI. Para o CEO eu diria: a TI deve ser concebida com base em processos, processos estes concebidos para viabilizar a organização que você projetou no futuro, na sua visão estratégica. Daí você compara a TI ideal concebida e a TI existente e saberá o quanto você necessita fazer para que a empresa chegue ao futuro almejado com a tecnologia que necessita.
CRM: E como isto afeta o dia a dia do CEO? Ainda não ficou claro.
Marcelo: Um CEO deve cercar-se de assessoria para diversas demandas de governança. Uma boa assessoria jurídica, uma boa controladoria, uma assessoria em comunicação institucional, uma equipe para estabelecer o relacionamento com o acionista, etc. Pois bem, recomendo-o que tenha uma assessoria em processos de negócio com 4 funções: 1 – conceba e atualize a visão macro de que processos devemos ter para atender aos nossos stakeholders hoje e no futuro; 2 – administre um banco de dados de processos existentes atualizados e expressos também de forma gráfica simples, organizados segundo os macroprocessos futuros; 3 – administre um banco de dados de processos futuros, também fluxogramados de modo simples, com base na crítica de inadequação estratégica dos processos atuais às referências estratégicas vigentes (missão, visão e valores, entre outros) e 4 – Organize a lista de ações que devem ser feitas para que os processos futuros ideais se tornem aderentes à realidade. E que a cada mudança na estratégia, estes 4 pontos devam ser revistos.
CRM: Diante desta sua proposição de uma assessoria de processos, o que acontecerá com a TI ou a decisão de investimento em TI?
Marcelo: Agora fica claro: se implementarmos sistemas que viabilizem os processos ideais concebidos com base na própria estratégia, estaremos contribuindo para a efetivação da própria estratégia acordada com acionistas, reguladores, com a sociedade, com clientes, etc. Veja, Claudio, são duas listas: uma lista de processos futuros, atividade a atividade descritos sobre como funcionarão no futuro e uma lista de ações necessárias. A lista de processos futuros é base para que o CEO saiba se as necessidades de informatização da empresa estão sendo bem atendidas e estão no caminho certo. “Este investimento vai viabilizar parte destes processos ideais? Sim, então, vamos fazer isto com a maior eficiência e economicidade possível.” E também deve perguntar: “Este investimento então foi concebido com base em um projeto que reúne parte das ações necessárias para que tenhamos os processos ideais? Vocês priorizaram com base em um planejamento para que todas as ações sejam realizadas? Se sim, então vamos em frete.”
CRM: Eu Poderia afirmar que isto parece ser útil apenas para grandes empresas? E mesmo nestas, a complexidade é grande e o volume de trabalho enorme quase inviabilizando na prática estas recomendações?
Marcelo: Claudio, acredito tratar-se de uma questão de percepção. Fazer a contabilidade, mesmo para empresas pequenas, requer muito trabalho de especialistas. Conceber e implementar um bom marketing é trabalhoso e arriscado. E o que dizer de estabilizar a produção? Ter tudo com uma qualidade previsível também dá trabalho. Pois devemos reconhecer, principalmente o CEO, que no novo milênio novas ferramentas de gestão são necessárias. Hoje mesmo, implementei um site para visualização de processos para uma empresa pequena. Este foi construído sobre medida para eles. A ferramenta de diagramação dos processos foi construída com MS Access integrado com MS Powerpoint, ambos programas amplamente conhecidos e acessíveis. Os diagramas são feitos no Powerpoint e seus dados são exportados para o banco de dados Access, onde os atributos dos processos são descritos. A ferramenta apresenta o banco de dados de atributos de processos atuais e seus diagramas, o banco de dados de atributos de processos futuros ideais e seus diagramas e o plano de ação para aprimorar os processos atuais e torna-los ideais. Somente escolhemos, por hora, colocar no dia a dia a utilização da referência dos processos atuais, para criar cultura sistêmica. Todos os gestores serão demandados a responder: “seus processos estão atualizados? Olha que a auditoria vem aí e seu bônus está associado a isto…” É apenas um primeiro passo. Ou seja, pequenas, médias e grandes empresas podem, precisam e devem investir nisto. A questão é: sua empresa será complexa porque você a trata como tal. Um CEO pode acreditar que se cada departamento da empresa executar as ações que lhe caibam, será suficiente para competir. Porém, isto não é mais verdade no novo milênio. Todos os gestores devem se sentir gestores DA EMPRESA COMO UM TODO e se perguntar: “Que ação, que melhoria, que investimento é necessário para que a organização seja mais competitiva?” E a resposta é: se você priorizar suas ações sobre os gargalos da empresa, mantendo o funcionamento de todas as demais atividades a empresa vai melhorar e as restrições vão se deslocar para outras atividades. Ciclicamente a crítica aos processos deve ser refeita e o investimento ter foco em novos gargalos. Como você passa a acompanhar menos pontos a serem melhorados (menos gargalos), isto significa que sua empresa terá menos complexidade e suas ações tendem a ser mais efetivas.
CRM: Nesta perspectiva, de que modo muda o dia a dia dos CEO’s?
Marcelo: eles terão mais evidências sobre o que deve ser feito, vão decidir mais rapidamente sobre projetos na certeza de que seus escopos estão melhor definidos, vão participar mais de trocas de ideias com outros gestores que estarão também mais conscientes do que é necessário ser feito e poderão lidar com as pressões do dia a dia com mais dedicação. CEO é um mediador por excelência, um inspirador comportamental, um formador de lideranças compromissadas com o futuro da empresa, um catalisador de inovação. Este conjunto de predicados está no seu código genético. Isto dá dinheiro. Isto gera realização. Isto gera valor. No seu microcosmo, vai conseguir entender o que seu suporte técnico deve fazer para que seu MAC esteja integrado com a rede da empresa. Ele deve pensar: quero que meu computador me permita comunicação rápida, acesso a indicadores concebidos com base em processos, que eu possa acompanhar os investimentos, que eu possa fomentar a inovação, etc. Neste exemplo, se algum destes aspectos não estiver sendo plenamente atendido é necessário verificar se não estamos diante de um gap e qual ação devemos priorizar para eliminá-lo.
CRM: Seu pensamento é amplo e instigante. Você coloca isto no seu dia a dia da sua empresa?
Marcelo: Casa de ferreiro, espeto de pau. Assim como todos os gestores, eu tenho gaps entre o que quero e o que faço na minha empresa. Mas tenho minha estratégia, todas as minhas decisões são estruturadas na forma de projetos, o escopo de minhas ações baseadas em processos, meu desenvolvimento de TI está alinhado com meus processos futuros. Mas eu também quero mais. Descobri que para ser mais produtivo preciso fazer outras coisas. Parece um contra senso. Mas não. A realização pessoal do CEO é fundamental para que ele seja um bom CEO. Ele não é uma máquina. Ele deve desenvolver atividades lúdicas. Eu montei uma banda de Pop/Rock acadêmico: os THE TEACHERS. Só professores de administração acima do nível de mestrado fazendo dois shows anuais no mínimo. Meses de preparação (estudo de processos musicais), planejamento (estratégico musical), operação (ensaios e treinos) e entrega (o show). Também desenvolvi um novo negócio em tecnologia para apresentações, o Vlearning (www.vlearning.com.br). Quero melhorar as reuniões, apresentações comerciais e aulas, desenvolvendo tecnologia para isto. Enfim, tento ser coerente com o que falo. Mas quero mais. Todo o CEO deve querer mais…
CRM: Agora um comercial por conta da casa: aos interessados, onde achar um pouco daquilo que você faz ou entrar em contato com você?
Marcelo: A PROVISION Consultoria Empresarial (www.provision.com.br) existe desde 1995 e nossa especialidade é apoiar a governança de empresas, especialmente em questões estratégicas, operacionais – processuais e em tecnologia da informação. Nosso objetivo é ajudarmos a empresa a ser uma organização mais preparada para competir no novo milênio e um lugar melhor para se trabalhar. Devemos lembrar que uma nova geração de profissionais vai procurar colocação no mercado em breve e demandará por um ambiente bem diferente do que temos encontrado por aí. Os melhores desta geração, aqueles que a sua empresa quer contratar, terão muitas opções em um mercado de oportunidades globalizadas. O prazo para reavaliarmos nossos paradigmas já está correndo. Nós temos desenvolvido tecnologias inovadoras e abordagens metodológicas renovadas para implementar estas proposições. Nós ficaremos honrados com o contato de interessados sobre estes assuntos (provision@provision.com.br).