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Leiam abaixo a entrevista que fiz com Patricia Cotton que palestrou no grupo Vistage que coordeno. Uma craque nos ensinamentos sobre como pensar realmente de forma inovadora, de forma inteligente. Uma ótima pedida para enfrentar momentos de crise. Aliás, é sempre bom lembrar a máxima que diz: “nunca desperdice uma crise”. Aproveitem a crise e a entrevista!

ENTREVISTA BASEADA NA PALESTRA “UP SIDE DOWN THINKING” FEITA POR PATRICIA COTTON NO GRUPO VISTAGE COORDENADO  POR CLAUDIO DA ROCHA MIRANDA 

Um dos termos mais desgastados no mundo corporativo é “inovação”. Existem cursos, MBA’s, artigos, etc. sobre o tema. Como se inovar fosse algo novo. Desde que o mundo é mundo, o Homem inova. Não por outra razão chegamos até onde chegamos. Apesar de importante a inovação vem sempre com “roupa velha”. Dificilmente abordagens novas e interessantes nos são apresentadas.

Recentemente, fazendo minhas pesquisas para o aprimoramento das discussões nas reuniões do grupo Vistage (de empresários, sócios, sucessores e CEO’s de organizações) que coordeno, no Rio de Janeiro, tive o prazer de conhecer e convidar Patricia Cotton para ter uma conversa conosco sobre o tema. Ela me surpreendeu por sua  abordagem que faz jus ao nome de sua empresa de consultoria: “Upside Down Thinking” e também pela sua ampla experiência internacional, contrastando com sua pouca idade. Para que o que ela nos disse, não ficasse restrito ao grupo convidei-a para um segundo tempo. Desta vez, para uma entrevista sobre alguns dos principais tópicos lá abordados. Confiram a seguir:

1. CRM: “Upside Down Thinking: O poder da transformação criativa” este é o título de palestra para a qual fui convidado e me despertou interesse no assunto e na palestrante. Qual o poder a que você se refere?

Patrícia: Comecemos pela palavra ‘poder’, que significa ter a faculdade ou a possibilidade de. Em tese, todos os indivíduos e negócios tem o poder de se transformar, mas infelizmente o dia-a-dia repleto de compromissos, excesso de comunicação fragmentada e ausência de reflexão profunda fazem com que com a criatividade e capacidade de evolução sejam asfixiados. O poder a que me refiro, portanto, é a capacidade que todos temos de nos transformar criativamente, que costuma ficar adormecida quando colocamos nossa atenção no que é “urgente” em vez de investir no que é de fato relevante.

2. CRM: “Upside Down Thinking” numa tradução livre seria: pense ao contrário. O que, por que, em que circunstâncias um empresário, um CEO, precisaria “pensar ao contrário”?

Patrícia: Quanto mais poder os CEOs adquirem ao longo da carreira, mais convencidos ficam de suas próprias manchetes e verdades. Pensar ao contrário, portanto, seria uma forma de oxigenar crenças que se tornaram cristalizadas com o tempo, mas que também podem ser limitantes. Um exemplo concreto de questionamento de crenças limitantes e inversão do fluxo de pensamento foi a recente dinâmica que apliquei com o nosso grupo da Vistage, em que os CEOs reclamavam da falta de tempo para a vida pessoal. Depois de um longo debate, foi possível chegar à libertadora conclusão de que, diferentemente do que pensavam, poderiam perfeitamente ter mais tempo para a vida pessoal, desde que conseguissem delegar mais, planejar e conduzir o crescimento do negócio de forma menos acelerada, entre outras coisas. Em suma, pensar diferente não nos leva necessariamente a agir de forma diferente, mas sem dúvida é um ponto de partida para a expansão da criatividade e maior consciência nas escolhas

3. CRM: Como resolver questões pessoais e profissionais com “soluções autênticas”. O que, quais seriam, exatamente, “soluções autênticas”? As demais não são autênticas, são falsas?

Patrícia: Vivemos numa era em que as fórmulas de sucesso tem imensa ressonância, e cuja promessa principal é em tese garantir uma certa previsibilidade, segurança e controle se fizermos X, Y e Z. Uma crença recorrente, por exemplo, é a de que os negócios devem sempre buscar crescer, assim como os profissionais em suas carreiras, como se crescimento por si só pudesse ser considerado estratégia e, pior ainda, evolução. Creio que buscar soluções autênticas neste caso seria questionar: o que o crescimento traria que não tenho agora? Quais seriam as perdas possíveis neste processo? Por que devo ir cada vez mais rápido, se para criar algo valioso e durável é justamente preciso ir devagar? Reflexão ainda mais rara, mas de suma importância, seria: ter mais dinheiro, mercado e status vale mais que ter menos tempo?

Em outras palavras, soluções autênticas devem nascer de dentro para fora para que sejam sustentáveis, e não o contrário.

4. CRM: Você pode explicar para nós o que é e como se faz o processo de “deflexão”?

Patrícia: Deflexão significa alteração ou desvio de alguém ou algo da posição natural. Tendo em vista que indivíduos e negócios possuem repertório próprio, o processo de deflexão que aplico dependerá do que e de onde cada um vem. Um exemplo disso foi quando o Ja Ma, CEO da Alibaba, pediu que todo o seu top management ficasse literalmente de cabeça para baixo em uma reunião, para que pudessem (desculpe o cliché) sair da zona de conforto e vislumbrar novas possibilidades, abrindo caminho para a inovação.

5. CRM: Transformação é o mesmo que inovação?

Patrícia: Não. Transformação pressupõe a mudança de um sistema já existente, ao passo em que inovação é o processo de aplicação prática de algo novo. O ponto em comum é que tanto a transformação quanto a inovação costumam ser processos longos, laboriosos, não lineares e muitas vezes doloridos.

6. CRM: Especialmente em tempos de crise, os empresários encontram-se, permanentemente, em dúvida. Dúvidas sobre o futuro, sobre o que cortar para conter custos, dúvidas sobre sua estratégia de negócios, dúvidas até sobre a sobrevivência “do negócio”. Em sua palestra para o nosso grupo da Vistage você falou: “na dúvida, pense ao contrário”. Você poderia melhor explicar como fazer para assim agir (ou pensar) e obter bons resultados nas situações nas quais os momentos de crise nos coloca?

Patrícia: Em primeiro lugar, acho que vale comentar que a dúvida pode ser tão válida quanto o saber.

Sobre pensar ao contrário, gosto do exemplo de um cara que adorava o trabalho, mas odiava o chefe. Depois de passar muito tempo com este conflito, o sujeito decidiu finalmente procurar um headhunter. Só que no caminho, pensou mais uma vez no problema e concluiu que a questão não era o trabalho dele, e sim o chefe. Resumo da ópera: ele recomendou o CV do chefe, que foi contratado por outra empresa, deixando espaço para ele ser promovido. Esta história mostra como acessamos de forma limitada as possibilidades que sempre estiveram ali, ao nosso alcance, já que pensar de forma inversa ao senso comum não é natural, mas pode trazer diversos ganhos e surpresas tanto para indivíduos quanto para organizações.

Em tempos de crise, portanto, pensar ao contrário pode nos ajudar a encontrar soluções novas, equilibrando a dose ideal entre liberdade e segurança. Como Jung bem disse, tudo depende de como vemos as coisas, e não de como elas são.

7. CRM: “Reframe tool” é uma técnica bastante utilizada por você. Do que ela trata, exatamente?

Patrícia: Conheci esta técnica quando fui fazer um treinamento na THNK, escola de liderança criativa holandesa. A premissa do ReFrame é que precisamos de uma perspectiva fresca quando estamos presos em um problema para que possam surgir novas soluções. Esta ferramenta, portanto, auxilia no processo de pensamento e criatividade de forma bem simples e eficiente ao mesmo tempo

8. CRM: O que são as “vacas sagradas” que todos nós temos?

Patrícia: As vacas são consideradas sagradas na Índia sem que ninguém questione essa verdade, realidade que infelizmente também se aplica metaforicamente a nós. Um exemplo disso é a inércia gerada pela crise, como se não tivéssemos outras opções. Quantas vezes vemos líderes apegados a “verdades absolutas”, ignorando que os tempos mudaram – e métodos, estratégias e objetivos ficaram obsoletos?

Apoiar-se cegamente em algumas crenças pode ser mais prejudicial do que pensamos, já que muitas vezes o status quo costuma ser mais perigoso do que o desconhecido. O caso Kodak que o diga! A empresa, então líder de mercado, inventou a câmera fotográfica digital e não quis investir em algo novo na época para não prejudicar seu negócio tradicional. Resultado: a Kodak entrou numa rota decadente que levou ao seu pedido de concordata algum tempo depois

9. CRM: Você pode nos contar um pouco sobre as suas “vacas sagradas” e como você lida com elas?

Patrícia: Uma das minhas “vacas sagradas” atuais é que não sei ou não consigo promover o meu trabalho. Lido com isso tentando me convencer de que no fundo não gosto e portanto não quero promover o meu trabalho, e um dos meus planos de ação é conceder esta entrevista. O grupo da Vistage, por sinal, me ajudou bastante neste processo de reformulação e – sobretudo – ação.

10. CRM: Você estudou em Berlim. Conte-nos o que você estudou e como foi parar lá?

Patrícia: Fui para Berlim por acaso inicialmente, numa viagem de férias que mudou toda a minha vida. Conheci a Berlin School of Creative Leadership nesta época e um ano depois me inscrevi para fazer o MBA global da escola, com módulos em Tóquio, Xangai, NY, California e Berlim. Foi uma jornada transformadora, que me mobilizou a revisar de forma profunda o meu trabalho e vida como um todo.

11. CRM: Patrícia, qual o seu trabalho atualmente?

Patrícia: Trabalho quase que integralmente com o Upside Down Thinking, que fundei em 2013 e que ajuda pessoas e organizações a transformarem ideias novas e conhecimento intuitivo em realidade por meio de processos inusitados e inversão do fluxo de pensamento

12. CRM: Você pode explicar o que significa e como se dá o processo de “inversão do fluxo do pensamento”?

Patrícia: Inversão do fluxo de pensamento consiste basicamente em questionar verdades cristalizadas, mapeando o que ficou obsoleto e abrindo espaço para se pensar diferente e até de forma oposta à “natural”. Ao contrariar – mesmo que temporariamente – o que o senso comum acha, é possível ter novos olhares sobre uma mesma questão, consequentemente expandindo a nossa criatividade, gama de escolhas e efetividade. Um exemplo concreto disso é a mentalidade brasileira, que tende a achar que “vai dar tudo certo”. Penso que uma dose de pessimismo realista e o questionamento “será que vai dar tudo certo mesmo?” pode nos preparar para refletir com mais profundidade sobre as coisas, sendo melhores em planejamento, preparo e processos, tanto no nível individual quanto organizacional.

13. CRM: Entre este pêndulo: palestras, mentoria e consultoria qual o que você mais se dedica?

Patrícia: Depende da época e de onde estou. Na Alemanha, por exemplo, atuo mais como palestrante, professora e facilitadora. Já no Brasil, tenho clientes variados de mentoria e consultoria, embora também dê cursos e palestras como a da Vistage, aonde nos conhecemos.

14. CRM: Patrícia, você poderia citar algumas diferenças entre os seus clientes brasileiros e alemães?

Patrícia: Meus clientes brasileiros em geral são mais abertos, flexíveis, criativos, mas também caóticos. Já os alemães são referência na forma estruturada de pensar e fazer as coisas, mas também mais avessos ao risco e ao improviso.

15. CRM: Você poderia nos resumir o que, exatamente, você vende? Qual o seu serviço, o que você agrega de valor ao empresário/executivo que lhe contrata?

Patrícia: Vendo o processo de deflexão que ajuda pessoas e negócios a se transformarem e a inovarem de forma autêntica, criativa e equilibrada. A entrega do trabalho geralmente acontece através de mentorias, workshops e Business Retreats que trazem novas lentes e insights sobre novos caminhos.

16. CRM: É um serviço prestado, absolutamente, sob medida. Você dispõe de tempo para novos clientes? Você trabalha somente para grandes empresas? As PME (Pequenas e médias empresas) têm condições financeiras para contar com seus serviços?

Patrícia: Como tempo é escolha, sempre tenho tempo para o que realmente me interessa. Respondendo de forma mais objetiva, trabalho com diferentes tipos de clientes e budgets, e é justamente isso que traz movimento e riqueza ao processo.

17. CRM: Sou supeito para elogiar sua palestra. Você fez um grande sucesso no meu grupo a ponto de, inclusive, convidá-la a dele participar e ter o privilégio de você aceitar. Agradeço, agora, sua disponibilidade para esta entrevista. Muito obrigado e até a próxima.

Patrícia: Eu é que lhe agradeço, Claudio. A Vistage tem sido fundamental para o meu desenvolvimento e esta entrevista foi um prazer. Obrigada!

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